A ficção científica vive da exploração de temas que, apesar de possíveis, ainda parecem distantes do homem. Desde seus primórdios com Julio Verne, que já no século XIX escrevia sobre viagens à Lua e aventuras dentro de um submarino, as histórias desafiam os limites da imaginação humana e, principalmente, as consequências desses avanços, tanto positivas como negativas.
Entre as principais áreas da ciência exploradas pelos filmes, a genética é uma das que cria o maior número de histórias e a que gera o maior número de debates à respeito das consequências de se brincar com o DNA humano e de outras criaturas. Fora as questões éticas já envolvidas pelo assunto, os filmes questionam principalmente os efeitos de tal ação, se seria prudente clonar ou modificar os organismos estudados para melhor aproveitá-los como armas ou para o benefício da humanidade, colocando sempre em cheque a ideia dos limites para a ciência.
São inúmeros os filmes que tem a manipulação genética como tema principal. Em todos, a arrogância humana é a principal responsável pelo cenário catastrófico que se desenrola. Confira conosco filmes da ficção científica que abordaram o uso da genética e suas consequências.
JURASSIC PARK

A trilogia original do diretor Steven Spielberg tinha uma temática que, ainda hoje, é discutida pela comunidade científica não só por sua realização, mas também pelas implicações que isso causaria: o uso de DNA para reviver espécies extintas. A inovação do Dr. Hammond (Richard Attenborough) de conseguir extrair DNA de dinossauros de mosquitos fossilizados em âmbar, o leva a gastar boa parte de sua fortuna na construção de um parque temático, onde as pessoas pudessem ver esses magníficos répteis em carne e osso. A ideia, que a princípio parece algo excepcional, logo se volta contra eles, justamente pelo fato de que dinossauros são criaturas extremamente incontroláveis e difíceis de prever, tornando-os extremamente perigosos quando soltos.
Esse foi um dos primeiros filmes a realmente questionar se seria possível reviver os dinossauros e, caso fosse, se seria correto fazê-lo. Em um mundo acostumado a ver tudo como uma arma ou um instrumento a ser explorado, trazer de volta à vida seres extremamente maiores do que nós e incapazes de serem controlados pode não ser uma boa ideia. Não apenas o primeiro, mas todos os filmes da trilogia abordam a ressurreição dos grandes répteis de uma maneira incrivelmente catastrófica, quer seja pela criação do parque, quer pela introdução das criaturas em uma grande cidade, na esperança de criar um novo parque em San Diego.

Jurassic Park foi ideal para mostrar como a ciência acredita ser capaz de controlar tudo o que cria, quando na verdade seus efeitos são imprevisíveis, principalmente no que diz respeito à criação da vida. O controle, nesses momentos, é uma ilusão que se revela da maneira mais cruel possível, custando gigantescas fortunas e, muitas vezes, custando vidas. Mesmo a ideia de que os dinossauros no filme não podem se reproduzir, pelo fato de todos serem gerados como fêmeas, é posta em cheque pelo fato de que, como é dito no começo do filme, foi usado o DNA de anfíbios para preencher as lacunas no DNA de dinossauro, e que alguns anfíbios são capazes de mudar de sexo para poderem acasalar. É como o doutor Ian Malcolm (Jeff Goldblum) afirma: “A vida encontra um meio”.
ALIEN: A RESSURREIÇÃO
O quarto filme da franquia Alien, e também o último, foi o único a explorar as questões de clonagem e de genética. Isso porque, enquanto os filmes anteriores tratavam a criatura como um ser desconhecido que a Companhia Weyland desejava capturar, nesse filme, a espécie está praticamente extinta e precisa ser recriada. Para fazer isso, os homens da companhia decidem clonar a Tenente Ellen Ripley, a última a carregar em seu corpo a cria de uma rainha.

Ao fazerem isso, eles não só são capazes de reviver Ripley e a rainha, mas acabam por mesclar os genes de ambas, alterando suas formas originais, com a mulher se tornando mais selvagem e de instintos mais apurados, enquanto a rainha se torna capaz de dar à luz como um humano, gerando um filhote mutante mais forte e inteligente que os demais. Seu gene híbrido é tão forte que o faz reconhecer Ripley como sua mãe no local da rainha.
Longe de ser algo que a Companhia esperava, a recriação dos xenomorfos causa problemas justamente pela introdução, dentro de uma nave de pesquisa, de uma espécie que se mostra mais inteligente do que seus captores esperavam, capaz de fugir de sua cela e espalhar o caos a bordo, enquanto possibilita a reprodução da espécie usando a tripulação lá existente. Isso é uma constante na franquia, onde a raça humana sempre acredita ser capaz de controlar uma espécie essencialmente selvagem, desconhecendo ou simplesmente ignorando sua capacidade de aprender rapidamente. Mais forte e com um instinto de comunhão com seus semelhantes maior, o alien desafia o ideal de que aquilo que é recriado pelo homem pode ser controlado e convertido em uma arma obediente. Sua natureza imprevisível é o que o torna tão terrível como predador, e o híbrido é uma criação ainda pior, pois é dotado de uma inteligência humana que herdou de Ripley. Uma clara ameaça, onde o instinto se mistura com a sapiência.
GATTACA
O universo de Gattaca explora a genética de uma maneira diferente dos demais filmes, aproximando seu contexto muito mais das questões de eugenia do que experiências de mutação. Nesse universo, sua genética determina quais atividades você está propenso a realizar, dividindo os humanos de acordo com o quão “perfeitamente genéticos” eles são. É nesse mundo que Vincent (Ethan Hawke) deseja poder viajar para o espaço, sonho impossível porque sua genética o coloca em um nível inferior.

Só por essa primeira questão já existem diversas discussões éticas possíveis: Seria possível julgar a capacidade de uma pessoa pelos seus genes? Obviamente não seria certo. Mostra-se assim um preconceito contra qualquer pessoa que não possua determinadas características que a fariam “puras”. Não se trata de uma divisão que não julga as reais habilidades de alguém, mas aquilo que se acha que ela é capacitada para fazer mediante características como cor da pele, descendência, etc.
Como se isso não fosse o bastante, o filme lança outra questão interessante. Para conseguir viajar pelo espaço, Vincent é capaz de se fazer passar por outra pessoa, de genética pura, através de uma experiência que novamente coloca uma dúvida em nossas mentes. Seria possível alterarmos nosso próprio DNA, de forma a conseguirmos nos passar inteiramente por outra pessoa? Caso isso se torne possível, podemos prever algumas consequências bem ruins para todos nós, com uma sociedade onde não poderemos mais confiar que sabemos quem as pessoas são.
STAR WARS: O ATAQUE DE CLONES E THE CLONE WARS

No Episódio II de Star Wars, somos apresentados ao planeta Kamino, local escolhido pelo mestre jedi Zifo Vias e pelo Chanceller Palpatine (sob o nome de Darth Sidious) para a criação de um exército de clones que serviriam à República. Usando o DNA do caçador de recompensas Jango Fett, eles foram possibilitados de criar milhares e milhares de soldados que serviriam e lutariam pelo seu Chanceller e ao lado dos Cavaleiros Jedi (pelo menos até a hora de executar a Ordem 66).
Um ponto interessante levantado sobre esse exército é de que clones são superiores aos dróides em batalha, justamente por conseguirem pensar individualmente e tomarem decisões estratégicas por conta própria. Aqui, é reafirmada a superioridade dos seres vivos perante as máquinas, limitadas, pelo menos até agora, a seguir as ordens e os comandos que são computados. Em vez de exércitos completamente servis e incapazes de serem inovativos, dá-se privilégios a um exército com pensamento próprio, capaz de improvisar e inovar para atingir a vitória.
Ao mesmo tempo, porém, levanta-se uma séria questão moral. Esses homens que estão sendo criados estão sendo enviados apenas para o combate. Eles são produzidos e amadurecidos rapidamente para poderem servir na guerra com mais rapidez e poderem morrer mais rapidamente pela República. Os membros do Senado se recusam a ver os clones como vida, e mesmo os soldados se veem, muitas vezes, como nada mais que soldados na linha de frente, com o único objetivo de lutar e morrer pela República. Por causa disso, somos levados a simpatizar com os soldados mostrados em The Clone Wars, a série animada, pela maneira como se dá o choque entre a imagem humanizada deles que nos é passada e essa ideia de que elas não passam de tropas.
A ILHA
Entrando no conceito de genética usada para a clonagem de humanos, temos o filme A Ilha, uma produção de Michael Bay que se passa em um mundo onde tal procedimento é permitido, com o intuito de produzir indivíduos iguais aos seus compradores para, na ocasião de uma necessidade de transplantar órgãos, por exemplo, existir na Terra alguém completamente equivalente. Mas esses clones não são cientes disso, e acreditam estarem em um laboratório de comportamento, esperando por terem a chance de irem para uma ilha paradisíaca.

Novamente, entra em cena o conflito ético da clonagem para o benefício da humanidade. Seriam nossas cópias vidas com tantos direitos como nós mesmos, ou apenas frutos da ciência, sem possibilidade de poderem decidir nada por si mesmos? Percebe-se, inclusive pela necessidade de se mentir para as criações, que existe uma ciência da capacidade dos clones de pensar e de decidir, de sentir por si mesmos. Mas, a partir disso, a mentira para esconder a morte necessária seria a melhor escolha? Os clones não sabem que são clones e, quando descobrem, fazem de tudo para fugir daquele laboratório e tentarem viver suas próprias vidas.
Percebe-se mais fortemente nesse filme a capacidade dos clones de tomar decisões por conta própria. Logo que descobrem o propósito para o qual foram criados, eles se rebelam e fogem desse destino. Essa capacidade de discernir entre o que desejam e o que não querem é o que gera o maior debate do filme, e um dos maiores impasses da ciência genética até os dias de hoje: a clonagem é realmente uma atividade ética e moral? Ou só estamos criando seres vivos para o nosso próprio benefício?
A MOSCA
Um clássico do diretor David Cronenberg, A Mosca tornou-se um cult do horror por sua monstruosa transformação e seus aspectos extremamente grotescos. Seth Brundle (Jeff Goldblum), um renomado e excêntrico cientista, em sua tentativa de impressionar uma repórter com sua máquina de transporte de matéria. Mas a experiência acaba dando errado por causa de uma mosca que se encontrava dentro da câmara com Seth. Por causa dessa junção, o cientista começa lentamente a se transformar em um híbrido com DNA do inseto.

Filmes de ciência que dão errado não são mais uma novidade no cinema (também não o eram na época do filme), e também não são algo inédito nessa lista. É a velha forma da ambição humana, buscando algo nunca antes visto e, que, cega por sua expectativa de poder e fama, não percebe o erro que está por acontecer. Contudo, o que é mais forte nesse filme são justamente os efeitos especiais da transformação, que colaboraram para criar a fama de Cronenberg como um diretor de filmes de monstros grotescos e deformados. Aos poucos, Seth vai se tornando mais e mais desfigurado, menos humano e mais uma aberração com traços de mosca em seu gene. Uma obra-prima da ficção científica que busca mostrar a aberração improvável e criar o medo em sua audiência.
EU SOU A LENDA
Nesse filme, a genética não se encontra tanto na recriação de seres humanos ou outras criaturas, mas nos efeitos de mutação que decorrem da introdução de um organismo ou uma substância em um corpo já existente. Na trama, o que se acreditava ser a cura para o câncer torna-se, na verdade, um vírus destrutivo que torna os humanos incrivelmente insanos e selvagens, incapazes de viver na luz solar e que se tornam carnívoros terríveis que caçam e matam os sobreviventes. Nesse cenário, Will Smith é um dos poucos imunes a esse vírus, e trabalha em uma cura.

Construindo esse cenário de apocalipse, onde os humanos remanescentes são caçados por essas criaturas mutantes, o que se vê aqui é uma mensagem sobre a imprevisibilidade da ciência. Os criadores da substância causadora tinham certeza absoluta de que ela seria a revolucionária cura para o câncer, e inclusive é transmitida essa informação pela televisão. Obviamente, os cálculos foram extremamente mal interpretados, ou não se fizeram os testes devidos em humanos para entender seus reais efeitos, o que mostra também o quanto a ciência precisa ser cuidadosa.
Um outro lado da ciência da mutação mostrado nesse filme está no trabalho do personagem de Will Smith, um doutor que trabalha desesperadamente em busca de uma cura para essa calamidade, testando seus soros primeiro em ratos para depois tentar os testes em uma humana mutante capturada. Cuidadoso, ele procede com grande rigor científico, analisando os resultados com precisão e deixando anotações para enviá-las a possíveis sobreviventes depois. Através dele, podemos ver, tanto no rato quanto no humano, a transformação rumo à normalidade e a destruição dos efeitos provocados pelo vírus original.
PLANETA DOS MACACOS: A ORIGEM
Testes em animais são um método muito usado pelas indústrias de cosméticos e farmacêuticas, entre outras, mas também levantam uma polêmica gigantesca em torno do mal que isso causa aos animais aprisionados. A nova adaptação de Planeta dos Macacos traz esse lado muito forte, ao nos contar como a inteligência primata que viria a dominar o mundo todo foi fruto de um laboratório humano, da mesma forma como foi aquilo que causou a nossa destruição.

Quando o uso de uma substancia testada para combater o Alzheimer acaba por criar macacos superinteligentes, a humanidade novamente tenta explorar esse lado ao máximo em seu benefício. Mas quando o líder Cesar (Andy Serkis) inicia uma rebelião contra seus mestres e leva todos os macacos consigo, temos em primeira mão o resultado dos trabalhos dos cientistas, e o que aconteceria se não fôssemos a única espécie dotada de inteligência racional.
Além de mostrar um mundo onde macacos são inteligentes, no entanto, o filme também apresenta uma outra abordagem, onde o mesmo vírus que tornou os macacos inteligentes torna-se um componente letal para os seres humanos, resultando em uma calamidade devastadora que quase nos leva à extinção. É assim que os novos produtores da franquia explicaram como se daria o alvorecer da era dos macacos e o fim da dos humanos: não seria pela rebelião dos primeiros, mas por nossa própria arrogância e falta de controle.
JURASSIC WORLD
Para encerrar, voltamos aos dinossauros. Dessa vez, em vez de um projeto experimental, o parque é uma realização que recebe milhões de turistas todos os anos, com um sistema de segurança extremamente sofisticado que aparenta ter aprendido com os erros de Hammond. Contudo, novamente entra o uso da ciência como forma de aumentar o lucro, e, agora que dinossauros não são mais uma novidade, os criadores do novo parque buscam na alteração e manipulação genética para criar novos monstros a partir dos seres já existentes. O resultado? Uma aberração capaz de se camuflar, com o tamanho de um Tiranossauro e a inteligência extrema de um Velocirraptor.

Apesar de ser um clichê que agrega muito pouco ao filme, a ideia de um monstro híbrido revive a ideia dos primeiros filmes, onde a ambição humana os fazer criar coisas sobre as quais eles não têm controle absoluto. A vida encontra um meio, mesmo sobre as tecnologias de segurança mais avançadas e os armamentos mais poderosos. Além disso, mostra a visão que os humanos têm da ciência: em face de algo inovador e único, nos contentamos por pouco tempo, e logo precisamos de mais, sempre mais do que já temos, até que o que criamos nos foge ao controle.
A arrogância humana em um mundo onde dinossauros ganham vida novamente assume nova forma em Jurassic World: Reino Ameaçado, onde os personagens do filme anterior retornam à ilha para salvar as espécies de uma explosão vulcânica. Mas o que parecia ser só uma missão de resgate se revela como uma tentativa das companhias de capturar os dinossauros e vende-los como armas, além de usá-los para desenvolver um novo predador, mais perigoso do que qualquer outro.
Existe algum outro filme onde a genética esteja por trás de toda a trama principal? Deixe nos comentários o seu favorito!