Em uma era dominada por remakes e readaptações, Hollywood demonstra todo o seu cansaço e a sua falta de ideias. Por causa disso, ir ao cinema hoje em dia não parece mais tão atrativo quando a maioria dos filmes lançados contam histórias já conhecidas e já vistas, algumas mais de uma vez. A sensação é de que não há nada que possa nos surpreender, mas mesmo assim algumas dessas readaptações ainda conseguem cativar o público e contar uma história que, apesar de conhecida, conquista o público por seu charme e sua boa execução. Amor, Sublime Amor é um desses filmes.
Readaptação do filme musical de 1961, que por sua vez adapta a peça teatral de 1957, a nova versão mantém quase todos os elementos da história de amor proibido entre Tony (Ansel Elgort) e Maria (Rachel Zegler), em um bairro de Nova York marcado pela intensa disputa entre duas gangues. Um Romeu e Julieta moderno, o musical ressalta bastante a impossibilidade desse amor. Tony é membro da gangue dos Jets e, mesmo que busque se afastar do grupo, ainda é atraído pelas suas amizades com os rapazes liderados por Riff (Mike Faist). Já Maria é irmã de Bernardo (David Alvarez), o líder da gangue porto-riquenha dos Sharks, que disputa o território com os Jets. Ao longo da história, vemos o amor do casal principal se tornar mais forte e profundo, ao mesmo tempo em que as tensões entre as duas gangues escalona a níveis extremos, culminando em um conflito armado com consequências desastrosas que forçam os dois a testarem o seu amor e buscarem uma saída daquele lugar.
Sim, é a mesma história contada no original, com seus mesmos personagens, sequência de acontecimentos e elementos principais, além das mesmas músicas. E, ainda assim, existe algo nesse filme do diretor Steven Spielberg que se torna extremamente atrativo, mesmo que já saibamos para onde a história caminha. Isso porque Amor, Sublime Amor reconta essa história aprofundando vários de seus principais temas a um nível que o filme de 61 não atingiu. Mantendo o tom trágico da história original, o novo longa mescla elementos dos musicais da era de ouro e os mergulha em um ar de realismo, às vezes com um tom irônico, no qual pessoas normais olham para os números musicais executados nas ruas da cidade com estranheza, dando a entender que aquilo não é algo rotineiro e que esses números se desconectam do mundo real por um momento. Em outros momentos, as temáticas de imigração, conflito de gangues, preconceito e problemas sociais são elevadas a novos níveis, dando maior peso à situação dos personagens e tornando-os mais humanos e palatáveis ao público.
Entre esse toque de profundidade realista e o reconhecimento irônico de como o musical destoa do mundo real, essa nova versão traz em si elementos únicos que fazem sua história já conhecida ser atrativa para o público por oferecer ao menos algo de diferente, se não na sequência de acontecimentos da história, ao menos na maneira como tais eventos são narrados.
Mas, para os amantes do musical original, o filme ainda preserva as músicas originais e suas performances, dando a elas todo o glamour advindo da Era de Ouro. São raros os momentos em que uma performance musical do filme deixa a desejar, e Spielberg consegue trazer as canções clássicas a um patamar contemporâneo que cativam um público mais jovem. Para além disso, também são efetuadas algumas mudanças com relação a qual personagem canta determinadas canções e em qual momento elas são cantadas. Tais mudanças podem parecer estranhas para aqueles mais familiarizados com o filme de 61, mas sua recolocação não afeta a narrativa de maneira negativa. Muito pelo contrário, esse remanejamento reforça significados diferentes das canções e cria novos contextos para sua execução.
Citando exemplos do que foi dito acima, as músicas "Cool" e "Somewhere" são as mudanças mais claras. Mantida como uma canção dos Jets, "Cool" dessa vez é iniciada por Tony e é cantada antes do conflito com os Sharks, em uma tentativa de evitar a guerra e impedir que Riff cometa um erro terrível. Assim, a canção ganha até mais significado do que a versão do filme de 61, que mesmo marcante, funciona como uma forma de acalmar a gangue após o conflito e soa um tanto deslocada no contexto após alguns minutos de duração. Já "Somewhere", cantada pela dona da drogaria, Valentina (Rita Moreno), dá à sua letra um tom mais geral de um pedido pelo fim dos conflitos, ao invés de funcionar como uma canção de esperança apenas para Tony e Maria.
As performances também são extremamente belas e cativantes, com a maior parte do elenco se entregando bastante aos seus papéis. David Alvarez e Mike Faist brilham em seus papéis como os líderes das gangues e dão intensidade à sua rivalidade, ao mesmo tempo em que expõe com clareza os conflitos pessoais de cada um. Rita Moreno retorna ao musical como uma surpresa magnífica, trazendo todo o seu charme e a sua experiência para um papel que ganha muito mais destaque com a sua presença. Rachel Zegler consegue bastante destaque como a protagonista, mas é incapaz de se equiparar a Ariana DeBose, que brilha no papel de Anita e se torna a principal estrela do filme por sua performance animada e dramática ao mesmo tempo, fazendo jus à sua indicação a Melhor Atriz Coadjuvante.
Com um elenco tão em sintonia, é até triste que o principal desfalque seja o protagonista. Mas Ansel Elgort não consegue se equiparar ao resto da equipe e sua performance chega a ser cômica em alguns momentos e, no máximo, sem sal no restante. Sua performance musical não deixa a desejar, mas suas expressões não entregam os sentimentos que o personagem deveria transmitir. É improvável que Spielberg não tenha reparado nesse imenso desfalque, o que torna sua insistência no ator, principalmente considerando também as inúmeras acusações contra ele, algo extremamente difícil de compreender e aceitar.
Amor, Sublime Amor não finge ser algo diferente do que é. Com uma história já premiada, é uma readaptação feita para conquistar prêmios e ser uma favorita da Academia e de Hollywood. Longe de ser um exemplar da antiga glória de Spielberg, que já há anos não consegue se equiparar aos seus anos de glória nas décadas de 70 a 90, o filme ainda assim possui elementos cativantes e únicos que o fazem se destacar como um remake feito com coração e atenção por sua equipe, e um dos melhores filmes do diretor na última década.
Tendo estreado ano passado nos cinemas, Amor, Sublime Amor se encontra disponível na plataforma do Disney+.