É engraçado pensar que, em um primeiro momento, Jim Henson não tenha considerado que suas marionetes poderiam levá-lo ao sucesso. A princípio, elas eram um meio para ele conseguir papéis na televisão, trabalhando no programa Sam and Friends, um show de marionetes exibido tarde da noite no canal WRC. Com o tempo, porém, o talento de Henson com marionetes se transformou em uma verdadeira arte e o levou ao sucesso e à criação de inúmeros personagens famosos até os dias de hoje.
Com a produção de um remake de Convenção das Bruxas e a série O Cristal Encantado: A Era da Resistência, recentemente cancelada pela Netflix, é possível ver que a influência de Henson nos dias atuais ainda permanece muito forte. Por conta disso, vale a pena revisitar a vida, a obra e o legado desse grande contador de histórias, que nunca precisou de muito mais que alguns bonecos para encantar gerações.
A CHAVE PARA O SUCESSO E OS PRIMEIROS ANOS
O sucesso de Sam and Friends levou Henson a criar a sua própria companhia em 1958, inicialmente chamada Muppets, Inc. e, muitos anos depois, The Jim Henson Company. Logo, suas criações começaram a se tornar famosas, aparecendo inicialmente em diversos comerciais e, mais tarde em programas como The Jimmy Dean Show e The Ed Sullivan Show.
Parte do sucesso estrondoso dos bonecos de Henson se devia à sua visão inovadora de que os controladores das marionetes não precisavam ficar escondidos por objetos físicos enquanto as controlavam. Instruindo os controladores das câmeras a focarem nos bonecos e deixarem os controladores fora de visão, ele permitiu que os fantoches dominassem a tela da tv e adquirissem comportamentos mais vivos e semelhantes a pessoas/seres reais.
Das produções de Sam and Friends, surgiram muitos personagens que se tornaram famosos ao logo dos anos e que passariam a compor o famoso elenco dos Muppets, incluindo seu mais famoso membro, Kermit the Frog.
Com o sucesso de suas parcerias com outros programas da televisão, Henson conseguiu se dedicar a alguns projetos pessoais, entre eles o curta Time Piece, que foi indicado ao Oscar de Melhor Curta Live-Action de 1966. Em 1969, ele recebeu uma proposta da Children's Television Workshop para trabalhar em um novo programa educativo para o canal PBS. Essa proposta o fez trabalhar em um dos mais revolucionários programas infantis dos últimos tempos: Vila Sésamo.
VILA SÉSAMO, OS MUPPETS E O SUCESSO NA TV
Introduzindo pela primeira vez personagens icônicos como Big Bird, Cookie, Elmo, Bert e Ernie, Vila Sésamo tornou-se um incrível sucesso e foi adaptado para inúmeros outros países. Com esse trabalho, Henson aperfeiçoou sua maneira de contar histórias, de maneira a criar um engajamento muito grande entre as crianças ao mesmo tempo em que as ensinava coisas de uma forma divertida.
O sucesso de Vila Sésamo, no entanto, fez com que Henson fosse estereotipado como um produtor apenas de programas infantis, algo que ele passou anos lutando para se desfazer, tendo inclusive pleiteado um posto na equipe inicial de Saturday Night Live, em 1975, sem muito sucesso. Foi a partir disso que ele desenvolveu um novo programa de fantoches que, ao contrário de Vila Sésamo, teria um humor mais sofisticado e traria temáticas mais interessantes para um público mais velho. Nenhuma emissora americana demonstrou interesse, mas o produtor britânico Lew Grade logo comprou a ideia. E assim, em 1976, nasceu o The Muppets Show.
A princípio, o show teve dificuldade em conquistar a audiência, o que levou a uma ausência de convidados. Contudo, já em sua segunda temporada, os Muppets se tornaram um grande sucesso, e muitas estrelas começaram a fazer aparições, como Liza Minnelli, Steve Martin e Elton John. Logo, o show se tornou o programa mais assistido da história da televisão, faturando três Emmys ao longo da sua história.
A JORNADA PELO CINEMA
Com o sucesso de The Muppets Show, Jim Henson se lançou em um novo desafio e, em 1979, produziu Os Muppets: O Filme, desafiando a opinião de que os seus personagens nunca funcionariam no universo cinematográfico. O sucesso da produção o levou a uma nova onda de criações, voltadas agora para o universo dos longa-metragem.
Seguindo o sucesso dos Muppets, Henson trabalhou em um de seus mais populares filmes de fantasia, O Cristal Encantado, de 1982, uma obra completamente diferente das anteriores por explorar um universo de intensa fantasia e com um tom mais sombrio do que as produções anteriores. Outro filme com uma proposta de tom semelhante foi Labirinto, de 1986, que foi produzido por George Lucas e contou com um elenco formado por David Bowie e Jennifer Connelly. Além desses trabalhos, ele continuou obtendo enorme sucesso na TV com produções como Fraggle Rock e The Storyteller, que mostraram não só o talento genial de Henson, mas também a sua capacidade de manter seu sucesso ao lado de sua consciência social e integridade artística.
OS ÚLTIMOS ANOS
No final dos anos 80, Henson iniciou seus projetos em parceria com a Disney, produzindo a icônica série A Família Dinossauro, além da criação de um parque temático, o Muppets-Vision 3D/4D. Durante esses anos, ele também se dedicou à sua Creature Shop, uma empresa especializada em criação e confecção de bonecos e animatrônicos que se tornou uma referência mundial na área.
Em 1990, produziu aquele seria seu último filme, Convenção das Bruxas, que, como os anteriores O Cristal Encantado e Labirinto, apresentava um tom bastante sombrio e assustador, tornando-se um clássico de terror infantil e um filme marcante por seu uso de maquiagem, principalmente para a criação da personagem de Anjelica Huston.
Ainda naquele ano, Henson faleceu aos 53 anos, vítima de um caso grave de pneumonia. Seu funeral foi sentimental e contou com homenagens feitas por diversos de seus personagens, cada um pagando respeito ao seu grande criador. Henson foi cremado no Novo México, e muitos de seus trabalhos foram mantidos vivos graças aos esforços de sua esposa, Jane Henson.
O LEGADO DO MESTRE DAS MARIONETES
É impressionante como, em um mundo onde cada vez mais os filmes se valem de efeitos visuais e computação gráfica, um homem como Jim Henson, que passou a vida entre marionetes, animatrônicos e efeitos práticos, detenha tanta influência nos dias atuais quanto ele detém. Sua obra é referenciada por toda a cultura do entretenimento pela forma como ele conseguia contar histórias que seguravam a atenção do público de uma maneira completamente natural.
Mesmo após décadas, Os Muppets e os personagens de Vila Sésamo são extremamente amados por milhares de pessoas e continuam a ser apresentados ao público ainda hoje. Em 2011, a Walt Disney Company lançou uma nova versão em cinema para Os Muppets, filme que se tornou um Blockbuster e arrecadou um Oscar de Melhor Canção Original. Kermit, Miss Piggy, Animal, Gonzo e todos os outros são parte quase que essencial da cultura pop atual. Mas além deles, outras grandes produções de Henson ainda vivem e atraem o público. A existência de uma série da Netflix contando os acontecimentos anteriores a O Cristal Encantado e a realização de um remake de Convenção das Bruxas mostram como a sociedade ainda se dispõe a manter as produções de Henson vivas após todos esses anos.
Contudo, o maior legado de Henson para a cultura do entretenimento é certamente sua habilidade de, através de um design e de efeitos simples, construir histórias extremamente inovadoras e profundas, colocando o conteúdo antes da forma e, assim, maravilhando espectadores décadas depois de sua morte, em uma época onde efeitos visuais seriam capazes de dar um visual muito mais polido às personagens. Mas essa é a grande essência do trabalho do mestre das marionetes: contar histórias tão boas e repletas de significado, que seus fantoches tornam-se os meios perfeitos para transmiti-las.