Após a Guerra Civil Estadunidense, o Capitão Jefferson Kyle Kidd (Tom Hanks) ganha a vida viajando de cidade em cidade, lendo notícias de jornais diversos para o público que não tem tempo ou capacidade de ler. Em uma de suas viagens, ele se depara com o cenário de um ataque e conhece a jovem Johanna (Helena Zengel), uma garota de origem alemã, mas criada durante boa parte de sua vida pelos indígenas da tribo Kiowa. Sem poder deixá-la com ninguém, Kidd decide levá-la até Castroville, onde é dito que ela teria tios ainda vivos.
Como qualquer filme "Road Trip", o foco principal de Relatos do Mundo é a relação entre seus dois personagens principais. A princípio estranhos um para o outro, Kidd e Johanna vão aos poucos aprendendo a conviver, em um relacionamento difícil mas que lentamente vai rendendo frutos enquanto eles seguem viagem pelas paisagens do Velho Oeste. Muitos dos desafios enfrentados (a inexperiência de Kidd como "pai", a desobediência de Johanna diante das regras da sociedade, a completa diferença entre os mundos nos quais os dois vivem), são agravados por problemas de linguagem. Educada pelos Kiowa, Johanna fala apenas na língua nativo-americana, desconhecida para Kidd, o que gera sérios problemas no entendimento entre eles.
Parando em todas as cidades pelo caminho, o capitão tenda continuar com sua profissão apesar de suas responsabilidades com a garota. Um contador de histórias profissional, Kidd ganha a vida lendo notícias de jornal para o povo das cidades, mantendo-os informados sobre tudo o que ocorre em outras regiões dos Estados Unidos. E é nesse aspecto que ele descobre uma forma de se conectar com Johanna, que gosta muito de ouvir suas histórias. A partir dessa primeira conexão, o relacionamento e a amizade dos dois vai se desenvolvendo de uma forma mutualista, na qual cada um ensina ao outro coisas diferentes sobre as culturas nas quais foram criados.
São esses tipos de troca e de relações que podem fazer um filme "Road Trip" se destacar, mesmo com uma fórmula já conhecida e meio batida. Tudo depende da química entre seus atores principais, e Hanks e Zengel apresentam química de sobra, vendendo muito bem a imagem de dois estranhos que vão aos poucos se conhecendo e desenvolvem laços praticamente familiares durante a narrativa.
Ambos também são muito bons em transmitir os traumas que cada personagem viveu e que, no final, acabam unindo-os em suas jornadas individuais. Pois Relatos do Mundo é também um filme sobre enfrentar seus demônios internos e sobre a necessidade de se lembrar e de passar por um período de luto e de remorso para que se possa seguir em frente. Por causa disso, é interessante ver como as diferentes culturas ensinam a cada um dos personagens uma forma única de ver o mundo. É um trabalho muito bom da narrativa a forma como essas visões únicas se chocam durante todo o filme até que, por fim, se misturam e influenciam cada um deles à sua maneira, proporcionando um tipo de aprendizado que só as trocas culturais podem proporcionar.
Mas muito além de apenas um "Road Trip", Relatos do Mundo também apresenta um lado completamente voltado para o Faroeste, que influencia o filme em dois aspectos extremamente visíveis. O primeiro é o da fotografia, extremamente bem trabalhada e tirando o máximo das maravilhosas paisagens do oeste estadunidense, com suas pradarias, desfiladeiros e montanhas criando paisagens belíssimas de se admirar e transmitindo aquela já reconhecida ideia de "um mundo a ser desbravado". O segundo aspecto é a tensão, que explora muito mais do que apenas os conflitos pessoais presentes na maioria dos "Road Trips" e incorpora alguns obstáculos externos realmente perigosos, com ladrões, pistoleiros e fenômenos naturais se colocando na trajetória de Kidd e Johanna e proporcionando momentos de verdadeira tensão para o público. São esses momentos que fazem com que o filme dobre um pouco a fórmula e apresente situações um pouco inovadoras para os fãs do gênero.
Dirigido por Paul Greengrass (Trilogia Bourne, Capitão Phillips), Relatos do Mundo é uma história sobre um relacionamento e seu desenvolvimento em meio às pradarias do Texas. Uma história com um bom arco dramático e bastante capaz de emocionar seu público, principalmente pela atuação de seus protagonistas. É um típico filme da época de premiações, e deve figurar em muitas celebrações e festivais nos próximos meses, sendo possível até que ganhe alguns prêmios, como Melhor Trilha Sonora e Melhor Atriz Coadjuvante para Zengel. Hanks também tem chances de competir, mas sua atuação nesse filme já é muito reconhecida por aqueles que acompanham o ator há algum tempo. Sólida, forte e marcante, mas não uma de suas melhores.
Pode até não ser o filme mais marcante do ano, mas certamente é um bom divertimento para toda a família, é com certeza deve ser incluído como o mais novo acerto da Netflix.