Em 1974, Tobe Hooper lançou o filme O Massacre da Serra Elétrica, um clássico do terror sobre um maníaco mascarado que persegue jovens e os mata com a sua serra elétrica. cheio de elementos gore e dotado de elementos do terror que, até então, não tinham sido explorados pelo cinema, o filme foi marcante dentro do gênero por iniciar duas novas tendências: a primeira é a de filmes de terror inspirados em eventos reais; a segunda foi o lançamento das bases nas quais se apoiaria o subgênero do Slasher.
Extremamente conhecido nos dias de hoje, o Slasher chocou o mundo quando surgiu pela primeira vez por seu estilo muito mais gráfico, baseado no horror físico e em assassinatos terríveis. A premissa desse subgênero baseia-se em torno de um assassino, na grande maioria das vezes mascarado, mas sempre humano ou com corpo humanoide, que persegue um grupo selecionado de personagens, em geral jovens, e os mata de formas grotescas e, em vários casos, bastante criativas. Esses jovens podem ter alguma relação com o assassino, mas no geral são apenas um grupo de adolescentes que decidiu fazer uma viagem rumo a um local isolado e acabaram se encontrando em meio ao seu território de ação.
Nos Slashers, o que torna seus assassinos assustadores é uma certa dualidade, na qual eles ao mesmo tempo são extremamente reais, muitas vezes humanos comuns ou espectros que outrora foram humanos, mas também são completamente inumanos, de natureza fria e sem qualquer sinal de empatia ou compaixão, matando simplesmente porque sua vítima estava em seu caminho. Eles não precisam nem mesmo ter um objetivo definido, basta que eles vejam um grupo de pessoas no local onde vivem e, por algum instinto doentio de seus seres, se coloquem a caçá-los.
É também muito importante que esses assassinos não possuam armas de fogo, poderes destrutivos sobrenaturais ou habilidades monstruosas. Seus instrumentos de caça são facas, facões, machados, serras e sua própria força, além de quaisquer outros objetos que eles encontrem pelo caminho, de pregos e madeira até pás e cordas. Tudo na mão dessas personagens se torna uma arma mortal. Existe, inclusive, uma tendência dos Slashers para que ao menos uma das mortes na tela seja realizada com um equipamento incomum e de maneira jamais pensada, o que aterroriza o público, mas também o diverte pelo inesperado.
OS GRANDES ASSASSINOS
Faz quase cinquenta anos desde que o Slasher se popularizou como um dos grandes gêneros do cinema. Nesse período de tempo, a fórmula se modernizou diversas vezes, incorporou aspectos das tecnologias de novas eras, criou novas máscaras e rostos assustadores para seus assassinos, alterando as regras de sobrevivência e até mesmo criando sátiras com essas mesmas regras. E a partir de todos essas mudanças, inovações e novas formas de fazer filmes, o gênero criou também alguns de seus assassinos mais notórios.
As características que fazem um bom assassino de Slasher já foram descritas: uso de uma arma branca, geralmente com uma máscara cobrindo o rosto, persegue grupos de jovens e adolescentes. Em vários casos, eles podem "brincar" com suas vítimas, criando uma tortura psicológica enquanto as perseguem que torna a caçada ainda mais divertida para eles. Em outros casos, eles são silenciosos e frios, simplesmente indo até a vítima e a matando sem cerimônia. Cada tipo de assassino cria um determinado tipo de terror, e a forma como eles trabalham esse terror é o que os torna memoráveis ou não.
Do lado dos assassinos silenciosos, temos o primeiro de todos, Leatherface, que aterrorizou o mundo em O Massacre da Serra Elétrica (1974). Portanto sua famigerada serra e uma máscara feita do couro de suas vítimas, Leatherface não dizia palavras, e tudo o que saía de sua boca eram grunhidos de ódio contra os jovens que se aproximaram de sua residência. Ainda hoje, pela maneira como executou suas vítimas, ele é um dos mais sanguinários assassinos à primeira vista. Entretanto, sua lista de vítimas no cinema pode não ser tão alta em comparação a outros que tiveram suas franquias prolongadas e exploradas por muito mais tempo.
Ainda entre os calados, estão Michael Myers, da franquia Halloween, e Jason Voorhees, de Sexta-Feira 13. Michael se tornou um dos mais famosos assassinos de Slasher e aquele que, atualmente, detém o maior número de mortos no cinema. Imprevisível e silencioso, ele age como um stalker, observando suas vítimas por longos períodos de tempo antes de atacar, mas sempre desferindo um golpe mortal com sua confiável faca de cozinha quando é necessário. Do outro lado, Jason se vez famoso nos arredores do Acampamento Crystal Lake, onde criou uma grande pilha de jovens mortos, muitos de formas bastante não-convencionais, usando de uma infinidade de recursos em sua jornada para vingar a morte de sua mãe, Pamela.
Mas nem todos os assassinos Slashers são silenciosos e frios. Uma nova geração desses assassinos assumiu uma personalidade brincalhona, que tortura suas vítimas enquanto as persegue, fazendo piadinhas e rindo malignamente, pois sabe que, no final, não há escapatória. Esses são os assassinos irônicos, ácidos, como Freddy Krueger, de A Hora do Pesadelo, Chucky, de Brinquedo Assassino, e Candyman, de O Mistério de Candyman. Criaturas que se deliciam com suas maldades e não podem deixar de fazer comentários jocosos a respeito de suas vítimas. Esses exemplos caminham em um limiar da comédia e do terror, sendo assustadores de se ver em ação, mas sempre desferindo comentários que não deixam de ter um humor pesado que os torna únicos e divertidos.
Outro grande exemplo de um assassino sarcástico está Ghostface, da franquia Pânico. Vivido por vários personagens diferentes, esse assassino não diz nada quando ataca as vítimas, mas sempre liga para elas antes de seu ataque e as questiona sobre filmes de terror. Sua tortura é bastante presente e é parte crucial de seu método de operação, permitindo a ele brincar com seu alvo por um longo tempo antes de finalmente atacá-los. Ghostface também funciona bem como uma metáfora para todos esses assassinos, expondo a fórmula que os construiu de maneira tão sólida que escancara toda a construção do Slasher, obedecendo as regras de ação dentro do gênero e respeitando as premissas do Slasher.
Independente de como o assassino se construa, no entanto, é essencial que ele tenha uma presença forte no filme, seja esta assustadora ou divertida de se assistir, para que eles possam ser de fato lembrados por seus feitos dentro do cinema. E, após quase 50 anos, com tantos assassinos criados e tantos filmes feitos sobre essa temática, torna-se difícil para que novos personagens ganhem destaque dentro do gênero. A maioria dos grandes assassinos Slasher já vêm de grandes franquias, alguns deles conseguindo emergir de filmes realmente surpreendentes feitos por mentes realmente criativas. Muitos outros casos, porém, são apenas a repetição da fórmula sem um personagem atrativo por trás da máscara. Nesses casos, não importa o tipo de matador que você cria, ele não terá muito o que oferecer.
AS VÍTIMAS DESAFORTUNADAS
Nenhum assassino seria marcante sem suas vítimas, jovens despreocupados com a vida, interessados em beber, festejar e transar, que acabam sendo infelizes o bastante para caírem nas garras desses monstros. É comum que esses filmes sempre tragam um grupo de jovens em excursão, ou destaque um determinado grupo de amigos dentro de uma comunidade para que eles sejam as vítimas do assassino. E nesse quesito, a fórmula seguida por esses filmes determina também a natureza de cada um desses personagens, colocando-os em um tipo determinado de estereótipo.
Em primeiro lugar, existe sempre o atleta, um rapaz mais forte e geralmente mais oferecido, de temperamento explosivo e que não tolera quando outras pessoas tentam ser o líder do grupo. Em geral, ele acaba morto por seu próprio temperamento explosivo, que o coloca em um conflito direto com o assassino do qual ele nem pensa em fugir. A personalidade do atleta contrasta com a do nerd tímido, um membro mais recluso do grupo, que quer fazer parte as atividades dos outros mais descolados e acaba se metendo em problemas por causa disso. Sua morte vem quando essas tentativas o levam a se afastar do restante do grupo e a ficar sozinho, enquanto os demais não pensam seriamente em procurá-lo.
Outro estereótipo que está sempre presente nos filmes Slashers é o da garota vulgar, em geral a menina mais animada e festeira do grupo, aquela pela qual todos os garotos se apaixonam e aquela que tem mais chances de aparecer nua nas câmeras. Isso se tornou um aspecto tão presente nos filmes do gênero, que desde o início se dispõe a explorar a nudez em cena e criam momentos sexuais entre os jovens que, nos primeiros anos do gênero, até serviam para chocar o público, ainda pouco acostumado à nudez no cinema, mas que hoje em dia se tornaram um artifício repetitivo. Sempre há uma garota louca por sexo e que vai aparecer nua na tela, e ela sempre vai ser morta em decorrência disso, porque assassinos Slashers odeiam sexo.
Entre os outros personagens que aparecem, temos o garoto idiota, um rapaz cujos interesses se resumem a teorias conspiratórias, garotas e drogas. Ele é o esquisitão da turma, o cara que se acha descolado, mas que na verdade é apenas embaraçoso, o rapaz que diz que não se importa com nada e age justamente dessa forma, vagando pelo cenário em busca de um lugar isolado para fumar alguma coisa. Essa busca em geral o leva a se isolar do grupo, e é nesse momento que o assassino o pega.
E, por último, temos a chamada "garota final", a última sobrevivente, em geral uma moça mais tímida e reclusa, que anda junto do grupo mas não participa tão ativamente nas festas, bem comportada e virgem (porque é impensável que a heroína desses filmes seja sexualmente ativa). Seu destino é incerto nos filmes, e ela pode sobreviver ou ser morta nas cenas finais. Independentemente do resultado, é ela que sempre chega ao clímax do filme e ao enfrentamento final, e é dela que vem o golpe derradeiro contra o assassino (pelo menos até o momento em que ele for ressuscitado pela franquia novamente).
AS FACAS E AS MÁSCARAS APÓS 50 ANOS
O Slasher causou uma grande revolução no terror, introduzindo um estilo de filme que se abriu muito mais ao gore e ao explícito dentro do terror. Sem a sutileza de filmes de monstros e assombrações, o Slasher assumiu para si um lado mais visceral, que consegue produzir um grande filme assustador e realmente cativante em determinados momentos, enquanto em outros se reduz ao "trash" violento e banal. E foi com esse equilíbrio que o gênero chegou aos dias de hoje como um dos mais amados do cinema.
Hoje em dia, o Slasher atingiu um momento em que, para a maioria das suas produções, a escolha óbvia é seguir a fórmula que o gênero criou para si durante todos esses anos. Isso resulta em alguns filmes bastante decepcionantes, que não oferecem muito para que seus fãs além daquilo que eles sempre vêm quando vão ao cinema. Eles se esquecem que repetir a fórmula sem apresentar personagens cativantes ou um assassino realmente marcante só fará com que seu filme seja esquecido rapidamente.
Uma outra tendência é a de ressuscitar as grandes franquias do gênero, trazendo os assassinos e personagens já estabelecidos e que já conquistaram todo um enorme público que os adora. Assim, personagens como Michael Myers, Freddy Kruger, Jason e Ghostface continuam a reaparecer em novos filmes das suas franquias, muitos dos quais ainda conseguem manter a aclamação que eles detinham no passado. Contudo, após tantos anos dessas franquias, é extremamente difícil para essas histórias apresentarem algo novo sem caírem em exageros que destroem a imersão do público e removem boa parte do motivo porque tais personagens são tão amados.
É um período difícil para o Slasher, assim como para todos os gêneros do cinema. Mas isso não quer dizer que não hajam grandes filmes sendo feitos ainda nos dias de hoje. Mesmo que alguns ainda se prendam a essa fórmula apresentada, e mesmo que seu sucesso não seja tão grande quanto o dos clássicos, eles ainda conseguem introduzir elementos interessantes para conquistarem a atenção do público.
Muitos desses novos Slashers exploram a ideia da comédia, em geral satirizando a própria fórmula dos filmes ou apresentando uma situação absurda em meio ao terror para criar uma postura crítica e assumidamente despretensiosa. Filmes como Tucker e Dale Contra as Forças do Mal, Terror nos Bastidores e A Morte Te Dá Parabéns trabalham esse aspecto cômico sem abrir mão de momentos assustadores, mas deixando claro que o objetivo principal é analisar a fórmula por traz o gênero, não provocar sustos extremos.
Ainda na tendência de analisar e criticar a fórmula dos Slashers, O Segredo da Cabana cria uma situação ainda mais metalinguística, reconhecendo que tudo o que acontece na trama é um cenário montado por uma sociedade secreta que usa o terror para apaziguar deuses antigos. Nesse sentido, todas as situações reconhecidas dos Slashers, os clichês repetitivos e a trama já batida são necessidades que essa sociedade força aos personagens centrais para atingir seu objetivo.
Outros casos procuraram explorar o lado do sobrenatural, já reconhecido pelo gênero em casos como Freddy Kruger, Michael Myers e Jason. Nessa nova tendência, é interessante como eles buscam incorporar a ideia de constante retorno dos assassinos, algo que se tornou um marco irritante nas franquias mais duradouras. No caso de Rua do Medo, por exemplo, existe a noção de que a cidade é amaldiçoada, e que, de tempos em tempos, um novo assassino surge para destruir qualquer chance do local de prosperar.
Seja como for, essas novas tendências conseguem preservar o Slasher como um dos grandes gêneros cinematográficos, mesmo após cinquenta anos. Alguns de seus aspectos mais formulaicos começam a ficar datados, e é evidente que o gênero não detém mais o mesmo valor inovador e, em certos pontos, até revolucionário para o terror que ele possuía na época de suas franquias mais aclamadas. Ainda assim, o cinema ainda possui muito espaço para o horror que vem de homens mascarados com facas na mão e, de vez em quando, ainda surge um filme capaz de, se não nos aterrorizar por completo, ao menos nos divertir ao longo da sua duração.